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ARQUIVOS // INSTALAÇÕES

 

A centralidade da imagem e o seu papel fundamental no mundo contemporâneo - no mercado de consumo e nas novas modalidades de comunicação - está, acredito, a produzir exponencialmente um embrutecimento do olhar que reduz largamente as nossas sinestesias, nossa capacidade de leitura dos enunciados imagéticos, nosso arrebatamento. Muito devido à sua velocidade de circulação, sua constância e presença concreta enquanto mediadora do mundo, ligada às operacionalidades do sistema produtivo e mediático, fazemos-lhes aproximações autómatas, desinteressadas e desencantadas. Vemo-las de passagem, destituídas da mítica e da sacralidade que de sobremaneira as concebeu outrora nos altares, que conferiu êxtase, maravilhamento, magia e nostalgia. As fotografias de família que em outros momentos eram impressas e colocadas criteriosamente num álbum - as quais eram revisitadas de tempos em tempos e suscitavam emoções e sentimentos, saudade e nostalgia - são agora atiradas para os computadores, perdendo a sua superfície e materialidade. Não lhes doaremos tempo, não as observaremos com minúcia restaurada, já não nos afetarão com sua incomensurabilidade.

Um álbum de fotografia familiar encontrado em Ochtrup (Alemanha) em 2012 - que agarrei como uma lasca de tempo amadurecido – foi o gomo renovador e a partir do qual pude perceber o que estranhamente me havia escapado e que está omisso na imagem, o seu sintoma. Fui seduzido pela potencia da imagem enquanto dispositivo mnemónico, enquanto biópsia do passado, não por ser ela um reflexo ou uma representação fidedigna de determinado espaço-tempo, mas porque mais do que preservar o instante ela abre um campo de análise e de experiência de um corpo total. Ela permite antever mais do que a si própria, invoca uma verdade irrealista, um rizoma denso e ínfimo, camadas e desdobramentos partidos e repartidos numa multiplicidade de jogos e de tempos. Uma imagem avulsa mostra a minha própria singularidade e natureza, dialoga com meus desejos, sofrimentos e conceções. Assola e crava-se nos meus ânimos.

A insaciabilidade provocada por estas imagens fizeram-me procurar e colecionar outras de várias proveniências, vasculhando repositórios ou álbuns familiares, arquivos fotográficos, feiras de velharias, arquivos das ditaduras e das colónias, formando a minha pesquisa e o meu trabalho artístico. Considero que este olhar que apurei para a imagem estabelece uma resistência à circulação desenfreada das mesmas, possibilita para mim um tempo diferenciado de atenção e é esse tempo que gostaria de repassar aos outros.  

Ludgero Almeida 2018

 

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